sábado, 24 de maio de 2014

A Conquista de Ceuta

Julgada por muitos como erro estratégico português, pelo sorvedouro de recursos na sua manutenção, a conquista de Ceuta é uma fato marcante e, segundo veremos, inevitável na conjuntura histórica que se passava.

D. Henrique toma, supostamente, papel de protagonista na conquista

Vista aérea moderna da cidade em domínio espanhol
Um importante centro comercial do Marrocos no Mediterrâneo, ponto de partida para o corso berbere, pois a proximidade com a Europa tornava praticamente impossível o trânsito de velas sem que fossem percebidas por sentinelas. O estreito de Gibraltar tem apenas 15 quilômetros em sua menor distância. Sua localização geográfica não é apenas estratégica militar e comercialmente, por situar-se no chamado Marrocos Verde, menos árido, possui terras de importância agrária logo em suas vizinhanças.




Explico agora o porquê de acreditar que o empreendimento era simplesmente inevitável para Portugal.
Podemos citar motivos de toda sorte para o acontecimento: Econômicos, Políticos, Religiosos, Estratégicos e Oportunismo.
Muralhas da cidade. Nota para a bandeira de Espanha

Motivos Econômicos
Como dito, a cidade era rica e apresentava estrutura invejável, que incluía até um aqueduto, importantíssimo na região agreste em que se encontra. Havia interesse de concentrar os navios que por lá aportavam no porto de Lisboa, pois essa era a ideia mercantilista da época, da qual não se podia fugir. Esqueceram-se os nossos colonizadores, porém, que os mercantes de lá eram muçulmanos e dificilmente iriam ceder e comercializar em terras cristãs. Simplesmente desviou-se a rota comercial para Tânger, cidade próxima, e Portugal não veria os benefícios que queriam até a dramática conquista de boa parte do Norte do Marrocos, que ainda demoraria 56 anos.

Altamente fortificada, somente ataque surpresa poderia tomá-la

Motivos Políticos
Portugal passava por uma época iluminada em sua corte, mas uma linhagem bastarda estava no poder. Era necessária a demonstração desse valor. Foi, não por coincidência, pela participação nessa batalha, que os príncipes da inclícita geração Duarte, Henrique e Pedro receberam o título de cavaleiros. Além disso, era uma demonstração de poderio perante Castela, que se mostrava inclinada a invadir o Norte da África, como o fez mais adiante. Não obstante, Portugal ganhava pontos com a Cúria, ao combater os mouros numa cruzada ocidental.

Arquitetura belíssima
Religiosos
Principal motivo segundo os documentos da época. Mais que uma cruzada, o motivo religioso era, em grande parte, o que movia a propaganda e a adesão popular à campanha. Ignorantes aos imbricamentos econômicos e políticos, o povo português sabia bem que o inimigo islâmico tinha de ser combatido para o avanço da cristandade. Era uma época de romances de cavalaria, anterior a Cervantes e Dom Quixote, portanto, a imagem do bem contra o mal colava. Por isso podemos inferir que, apesar da documentação, os outros motivos tinham importância, apesar de não terem sido tão focados.

Estratégicos
Dominar a saída para o Atlântico pela África, evitando assim que Castela possuísse as duas Colunas;
Estender os domínios ao Sul e para o Oriente;
Tornar-se império, algo apenas possível no além mar, uma vez que Portugal estava cercado por Castela, superior em terra;
Derrotar os piratas marroquinos para comercializar livremente e alavancar Lisboa, com o fomento da rota marítima entre Mar do Norte e Mar Mediterrâneo.
Por mais que alguns desses objetivos não surtissem o efeito esperado, pelo menos o espírito imperial e a navegação de périplo africano e transoceânica tiveram seu impulso inicial nesse momento, por mais que os documentos da época não ligassem o contorno do Cabo Bojador, ou as expedições atlânticas, por exemplo, com o evento.

Oportunismo
Marrocos entrava em declínio após o ápice do poder com os Merínidas. Tanto é que os portugueses puderam auxiliar a quebra do reino em dois: Marrocos nas mãos dos Merínidas e Fez sob os Oatácidas. Importante salientar, apesar de não ser assunto foco do texto, que somente após essa crise em Marrocos que Portugal conseguiu controlar melhor as praças que ali mantinha.
Outro fator importante era a iniciativa prévia à Castela. Portugal buscou se adiantar, enquanto o reino vizinho ainda cuidava de seus assuntos com os Granadinos, fez campanha no Norte da África, até mesmo para ter opções no caso de conflito com castelhanos.

Breve Relato do Assalto
59 galés, 33 naus e 120 barcos menores, a maioria produzidos com incentivo a indústria naval portuguesa do rei D. João I. Cerca de 20 mil homens de armas entre lusitanos, biscainhos, galegos e ingleses. O primeiro desembarque foi realizado com grande sucesso e as forças portuguesas seguiram para a parte continental da cidade. Nesse caminho encontraram resistência, mas logo puderam seguir para auxiliar as forças do segundo desembarque. Tomaram a Mesquita, que seria convertida em Catedral e cercaram o castelo, para onde os cidadãos haviam fugido. Durante a noite, houve uma fuga dos aldeões para as florestas que cercavam a península. Por diversas vezes, os mouros tentaram agredir a cidade, mas os portugueses conseguiam, com a derrubada de árvores e guarnição munida de cavalaria, expandir a área dominada. Mesmo assim, não seria possível usar o solo fértil para produzir, uma vez que o assédio se mostrava intenso e constante. Daí é que começariam a aparecer os problemas logísticos da campanha.

Sorvedouro de gente e dinheiro, como D. Pedro, irmão de D. Duarte, mesmo disse, porém, inevitável e indispensável para que a história de Portugal seguisse seu rumo de ascensão.

Mais do que marcar o início da expansão portuguesa em império, 22 de agosto de 1415 marca a história pois, desde a invasão dos mouros na Península Ibérica dominada pelos Visigodos, os cristãos da região só faziam recuperar as terras perdidas, numa guerra sangrenta chamada de Reconquista. Ceuta foi a mudança de rumo dessa longa guerra, quando europeus passaram a ser os agressores em terras africanas. O controle do estreito também foi importante experiência de navegação, quando naves de vela menores e mais rápidas começaram a ser usadas.

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