terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Breve História do Papado - II

Continuação de Breve História do Papado - I

Para continuar a postagem, inicio com dados que obtive durante a pesquisa e que são muito ilustrativos para imaginar a época que descreverei. 5 Papas abdicaram; 21 morreram como mártires e outros 9 sobre martírio; 4 faleceram exilados ou aprisionados; 6 foram assassinados e 2 mortos durante revoltas; existiram nada menos que 37 antipapas.

Isso se deveu, em parte, à grande influência externa nos assuntos da Cúria. Ora os Bizantinos, ora o Sacro Imperador, ora a França, todos queriam pôr, no papado, alguém de confiança e que os favorecesse, sem se importarem com os meios.


O grande Cisma do Ocidente

O poder do Papa medieval atinge níveis inimagináveis. Por volta de 1300, Bonifácio VIII simplesmente livra o clero de impostos. A falta de Cartas Magnas fez com que o código canônico fosse amplamente utilizado em toda a Europa como lei.
 Em 1309, o rei francês deteve o papa em Avignon, onde permaneceu a linha sucessória até 1378, quando Gregório XI voltou para Roma, já perto de falecer.
É nesse contexto que, no mesmo ano, o eleito para sucessão, Urbano VI, recusa voltar para Avignon. Muitos cardeais o veem como autoritário e, na cidade de Fonti, decidem fazer um novo conclave. É eleito Clemente VII, que ficaria na sede de Avignon, com o apoio de França, Escócia, Nápoles, Borgonha, Savóia, Chipre, Castela, Aragão e, no Início, de Portugal também. Urbano VI ainda tinha apoio da Inglaterra, Países Nórdicos, Polônia, do Sacro Império, Hungria, Norte da Itália, Hungria e de Portugal sob a dinastia de Ávis.

Vale lembrar o contexto da política européia da época. A guerra dos Cem Anos entre França e Inglaterra levou as duas alianças a se oporem na questão. Da mesma forma, Portugal, sob Fernando I, apoiou Avignon. Depois da crise sucessória e a Revolução de Ávis, quando houve confronto contra Castela, não é estranho que João I passasse a apoiar o Papa Romano, alinhado com sua aliada, Inglaterra.

Em 1409, no Concílio de Pisa, foi eleito Alexandre V, na tentativa de um acordo, mas o que aconteceu foi que passaram a existir nada menos que três papas, cada um excomungando os fiéis aos outros. Nunca a Igreja chegou tão próxima de um fim sórdido, imerso em ambição e corrupção. Foi só no Concílio de Constança que se depuseram os três papas e se elegeu, em 1417, Martinho V, Sumo Pontífice (a expressão Pontífice foi herdada do Imperador de Roma quando da queda do Império). E se você acha que finalmente a violência teve fim, pois saiba que o pior momento ainda estava por vir.


O Papa Bórgia

Rodrigo Bórgia, o papa Alexandre VI
Com a morte de Inocêncio VIII, reuniu-se Conclave em 1492. Rodrigo Bórgia havia sido cardeal havia mais de 30 anos, nomeado por seu tio Afonso Bórgia (Papa Calisto III) e não era surpresa que fosse um nome forte para concorrer ao Trono do Vaticano. É sabido que ele gastou sua fortuna para subornar e comprar votos do conclave, além de intimidar quem pôde. Conseguiu o que queria: assumiu o Papado com o nome de Alexandre VI.
Sem querer bancar o advogado do diabo, acredito que muitas das acusações a ele atribuídas podem ser consideradas falsas, porém, é fato que, assim como a grande maioria da nobreza e do clero da época, Alexandre VI era corrupto e imoral de acordo com nossos atuais valores. As intrigas vão desde assassinatos a incesto.

De origem Castelhana, que por si só poderia ser motivo para desagrado de muitos, teve quatro filhos com Vannozza dei Cattanei: Juan, Cesare, Lucrezia e Jofre. Além de outros filhos com demais amantes (o celibato já existia). Entre as outras amantes, Giulia Farnese, mulher de Orsino Orsini, que por razão óbcia tinha tudo para odiá-lo. Um de seus filhos, Cesare, em especial, foi acusado de matar o irmão para assumir o papel de chefe do exército papal, que lutava contra os Turco Otomanos e, quando podia, tomava terras em seu próprio nome.

Entre as acusações menos embasadas, a de que Alexandre VI teria um caso com a própria filha, Lucrezia, provavelmente foi lançada para tentar impedir o casamento dela com uma família importante. Além, disso, houve uma suposta dupla tentativa de envenenamento entre ele e seu filho Cesare, mas que os mais sérios acreditam ter sido apenas uma doença contraída pelos dois, numa época de surto. Cesare recuperou-se, seu pai não.

Para conseguir driblar a oposição da Cúria, nomeou inúmeros novos cardeais sob seu comando, muitos familiares e até seu filho de dezesseis anos (que não é o cardeal mais novo, pois Calisto III, seu tio, nomeou um de treze anos, antes mesmo de sua crisma). Através de seus métodos, assumiu poderes sem limites, culminando na Bula que dividia o Novo Mundo entre Portugal e Espanha, por exemplo.
Seus principais concorrentes durante o conclave, Sforza e Della Rovere, se tornaram grandes rivais, com quem Alexandre VI lidava, sempre com ajuda de seu filho Cesare, de maneira aplaudida por Maquiavel, que elegeria Cesare como modelo de Príncipe Moderno. Savanarola, do clero de Florença, um grande opositor, foi humilhado publicamente, estrangulado e queimado; muitos outros de menor expressão seriam mortos, supostamente pelos Bórgias. A morte de Savanarola poderia fazer parecer que o Papa Bórgia era imbatível, mas foi uma semente da Reforma, que sucederia anos depois.


A Reforma

Martinho Lutero
Não só os cargos clericais estavam em constante disputa de interesses, mas também a posse de bens. A Santa Igreja era a Instituição mais rica do Ocidente, detentora de terras invejáveis a qualquer grande imperador. Além disso, os reis que buscavam centralização do poder precisavam de poder sobre a religião. Não obstante, o crescimento da burguesia era barrado pela imoralização da usura (juro), o mesmo tabu que causaria o rompimento das Ordens Cavaleirescas (criadoras dos bancos) com a Igreja. Foi graças ao apoio de nobres e burgueses ambiciosos que Martinho Lutero conseguiu sucesso na sua empreitada humanística da Reforma.
Como dito anteriormente, o movimento reformista já ganhava corpo, ao exemplo da atitude de Savanarola, ou dos Hussitas, liderados por Huss, que foi queimado na fogueira. As iniciativas eram graças ao movimento Humanista que se espalhava pelos quatro cantos da Europa, com base em diversas Universidades. Diria mesmo que, não fosse a ruptura com os humanistas em Castela, por parte dos Reis Católicos, a Reforma teria sangue latino, tamanha era a concentração desses pensadores em Universidades como a de Salamanca. Foi, porém, no coração do Sacro Império Romano Germânico que ela aconteceu, graças a atitude de Martinho Lutero que criou suas famosas 95 teses, nas quais contestava muitos dogmas da Igreja que considerava corrompidos. Não entrarei em detalhes sobre as teses, porque isso pode ser assunto para uma postagem própria, mas acredito que o principal seja repúdio a Compra de Indulgência (perdão de pecados mediante a pagamento) e a tradução da Bíblia (que faria da palavra das escrituras a lei, em detrimento da palavra dos Padres), além do fim do celibato, enfim, o suficiente para a ira do Papa.

A reforma Luterana foi o estopim para o surgimento de outras facções cristãs, como Calvinistas e Anglicanos, umas mais Burguesas, outras mais Monarquistas. Na tentativa de encontrar um solução, foi convocado o Concílio de Trento, onde foram elaboradas medidas de caráter reformista na Igreja: A volta do Tribunal do Santo Ofício (inquisição), proibição de livros, criação da Companhia de Jesus (catequistas para o Novo Mundo), adoção da Vulgata como a Bíblia Oficial e supressão aos abusos da indulgência. Para essas decisões se deu o nome, posteriormente, de Contra-Reforma.
As consequências da volta com força total do Tribunal do Santo Ofício causou o período conhecido como o mais negro da história da Igreja. Não que protestantes não cometessem atos tenebrosos, mas como foram eles que escreveram a história, no final das contas, foram os católicos que pagaram de Vilões. Na minha visão, o que se passou foi um estado de Guerra Civil Primitiva. Nessas questões, nunca há lado certo e errado. Por exemplo, em contra ponto à inquisição, pelo menos três Papas manifestaram repúdio à escravidão nas colônias americanas, fato pouco exposto.

O Papa viu, no contexto do surgimento do protestantismo, Roma ser saqueada; Nações Católicas como Espanha e Portugal, perderem suas posses coloniais para Inglaterra e Holanda; além da perda de muitos súditos na fé. Era o fim do auge do poder do Papa.


Napoleão, a Itália e a Questão Romana

Por duas vezes, o vaticano se viu simplesmente extinto. A primeira com a invasão francesa liderada por Napoleão Bonaparte e o início da idéia de Estado Laico. Qualquer revolta era severamente punida. Os Estados Pontifícios só foram restituídos pelo Tratado de Versalhes. Na segunda vez, porém, havia um ideal maior: a Unificação da Itália. Victor Emmanuel II nunca cederia territórios dentro da área de soberania italiana. Só em 1929, com o Tratado de Latrão é que se reestabeleceria o Vaticano, em proporções que nada lembram às da Idade Moderna.

O poder de influência política havia diminuído, mas continuava vultoso. A Doutrina Social da Igreja, que dava preferência ao Capitalismo, mas com interferências de cunho social do Estado e a formação de sindicatos era, num tempo de mudanças, uma idéia já com muita cara da Igreja Moderna. Ainda vale lembrar que, mesmo hoje, a Igreja Católica possui terras que, se somadas, formariam uma nação maior que muitas que por aí se encontram e que, mesmo não comparáveis ao luxo do passado, ainda há muitas riquezas sob domínio da Santa Sé.

Atualmente, o Vaticano possui menos de meio quilômetro quadrado e cerca de 800 habitantes.

Após o Concílio do Vaticano II, o papel do Papa moderno foi estabelecido, com sua vida de peregrinações em diversos países, como pudemos ver em João Paulo II, sempre em defesa da paz, caridade, ecumenismo e direitos humanos. Uma igreja mais humanizada, finalmente, que se arrependeu oficialmente de seus grandes pecados, mas que, aos olhos de muitos, ainda parece atrasada em suas ideias.

Atenciosamente.

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