quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Batalha dos Atoleiros - Tática do Quadrado

Durante grande parte da Idade Média, a cavalaria pesada foi a força motriz dos exércitos em batalha. Poucas vezes se viu uma grande cavalaria ser ineficaz diante de uma infantaria ou de uma cavalaria mais leve e menor. Muito da força política da nobreza vinha da necessidade de seus recursos para montar uma cavalaria numerosa e bem equipada.


Essa realidade começou a se reverter no século XIV e muitos historiadores colocam, em sua análise, seu foco na Guerra dos Cem Anos, entre França e Inglaterra.
É possível, no entanto, exemplificar essa mudança de paradigma com uma história muito mais "caseira", durante a invasão castelhana a Portugal, no período do Interregno de 1383 a 1385.
O rei de Castela, casado com a filha do rei de Portugal, D. Fernando, que morrera sem deixar herdeiro varão, queria para si a posse do trono português. A burguesia lusitana, no entanto, decidiu apoiar um conterrâneo, mestre da Ordem de Ávis, D. João, tendo início a escaramuça.

Apesar da burguesia portuguesa estar enriquecida, o exército consistia primariamente em infantes a pé. Já as forças castelhanas, além de muito superiores numericamente, possuíam muitos cavaleiros. É nessa necessidade de superar tamanha provação que Nuno Álvares Pereira idealiza a Tática do Quadrado, semelhante, em partes, a uma falange grega, onde lanças longas e em grande densidade e organização neutralizam totalmente a investida dos cavalos. A diferença para os exércitos helênicoss é que a formação contava com apoio de bestas e era quase impossível de ser flanqueada, ao contrário da falange, que tinha em suas laterais o seu ponto fraco, que trouxe o seu desuso e o início da era de ouro das legiões romanas, mais versáteis.
A cavalaria investia contra a linha de frente e sofria muitas baixas nas lanças longas, depois eram alvejadas pelas bestas até que o ataque era repelido. Numa segunda investida, os corpos de homens e animais caídos já consistiam em obstáculo e o ataque, já de um número menor de homens, tornava-se cada vez menos eficiente.
Outra característica eram os flancos móveis e o avanço da retaguarda, que podiam ampliar o comprimento da fileira, cercando o oponente de surpresa, ao invés de ser flanqueado.

Virtualmente impenetrável, essa formação extremamente defensiva e passiva (há que se dizer que só houve sucesso porque a guerra foi de defesa, nunca de avanço) foi responsável por vitórias históricas contra os castelhanos, o que assegurou a independência portuguesa nesse período conturbado:

Os três combates que fizeram do Quadrado a figura geométrica favorita dos portugueses:
Atoleiros  - A primeira em que a tática é usada. Vitória mais perfeita do exército português na história.
Trancoso - Pela ausência de Nuno A. Pereira, a tática é diferenciada e menos eficaz, mas surte efeito.
Aljubarrota - A derrota final dos castelhanos.






Por que Atoleiros?
Obviamente merecedora de destaque, a batalha de Aljubarrota foi muito maior, mas Atoleiros foi a Primeira em que se pode notar o uso da inovadora tática e, um fato dos mais intrigantes, não houve NENHUMA baixa nas forças portuguesas. Foram 1200 homens a pé contra 5000, muitos a cavalo, e nenhum homem sequer foi morto no lado em inferioridade numérica. O fato, tido como obra de Deus, permitiu a reunião de mais homens para o momento decisivo que viria no ano seguinte, em Aljubarrota.

Quando da investida inicial da cavalaria, os castelhanos pensaram que seria um vitória fácil, fazendo do ataque um pouco "afrouxado". Quando se encontraram com as lanças da linha de frente da infantaria lusitana, que estavam cravadas no chão para dar firmeza, os cavalos se feriram gravemente ou morreram, ou refugaram. Já desorganizada, a cavalaria preferia voltar e tentar outra investida ao invés de tornar o combate um corpo a corpo contra uma força mais concisa. A essa altura, a chuva de projéteis das bestas enfraquecia mais ainda as "superiores" forças de Castela.
Devemos saber, para visualizar uma cena interessante, que um ataque de cavalaria, por usar de animais, não pode ser tão facilmente abortado, especialmente se os cavalos estiverem a toda velocidade. Imagine, então, a surpresa dos castelhanos após a investida contra uma força pequena (a vanguarda portuguesa) que, de repente, se abre para os lados e deixa avançar pelo centro a retaguarda, esticando a fileira o suficiente para possibilitar o cercamento da cavalaria.
É fato que a moral de uma tropa é de importância equiparável a outros atributos de qualidade e só podemos tentar nos colocar na posição dos nobres cavaleiros de Castela, paramentados de armas, armaduras e animais caríssimos, vendo suas tentativas fracassarem e seus irmãos em armas caírem. Não é a toa que os combates terminavam sempre em fuga total desorganizada e perseguição da cavalaria portuguesa por quilômetros a fio, que matava muitos mais.


Para se ter idéia da importância do evento no nosso país colonizador, uma iniciativa muito interessante tem recriado, atualmente, em sua data comemorativa, a batalha dos atoleiros, com atores paramentados de armaduras e armas medievais. Não pude participar desse evento mas, se um dia visitar Portugal, pretendo fazê-lo!!!!

Atenciosamente.

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